domingo, 13 de abril de 2014

A literatura oitocentista de José de Alencar

“TODOS CATAM SUA TERRA/
TAMBÉM VOU CANTAR A MINHA”


Estes primeiros versos do poema “Minha terra”, de Casimiro de Abreu, sugerem a incipiente idéia do novo paradigma literário que se instala com a obra de José de Alencar, um romântico que entende o contexto geral do Brasil de sua época e realiza uma obra à frente de sua contemporaneidade.

O Brasil daquele período, dentre tantas características, já havia acontecido sua independência, que ocorre em 1822, passando a uma monarquia. Nesse contexto, era um país ocupado por uma mescla de várias culturas, o homem português, o negro africano, e o nosso nativo, o indígena. No entanto, aqui é preciso que se entenda independência até certo ponto, pois como sabemos essa independência não ocorre de imediato, mesmo dentro da literatura.

José Martiniano de Alencar, nome que herda do pai, nasce em 1829, e somente a partir dos 27 anos é que ele produz a sua obra consagrada pela Literatura Brasileira. A família desse intelectual é oriunda de berço de pai político e influente no Ceará, onde ainda uma criança, muda juntamente com a família para o Rio de Janeiro, em função da carreira política do pai.
    
Em 1855, esse escritor agora com 26 anos, é homem com formação no renomado curso de Direito, em São Paulo, e muitíssimo bem informado em literatura, área pela qual desde a adolescência demonstrou interesse e que persegue pela faculdade e o restante de sua vida.

A sólida formação intelectual de Alencar garante mais tarde sua posição de redator de um jornal, que ao ver um de seus artigos embargados, pareceu por bem sair daquele ofício para, em seguida, ser redator-chefe de um jornal adquirido que beirava à falência. Referente a este impedimento, do artigo que não é publicado, este episódio representa um motivo importante para ser esclarecido. Ocorre que, o conteúdo ali expresso critica diretamente à política do país de então, sendo o responsável pela crise, alguém cujo nome é um tanto representativo, D. Pedro II. Assim, o jornal que possui seus interesses particulares é prudente em se opor à divulgação; divulgações com caráter de denúncia social, denúncia que Alencar realiza em sua vida.

Essa postura do Alencar também jornalista, de criticar a monarquia no ato de suas atribuições, custou muito a ele, tanto na política quanto na literatura daquela época. Ele encontra nessas críticas a oportunidade de responder, com veemência, aos embargos que sofre. Alencar mais tarde passaria por situação semelhante. Vamos sem delongas a este fato:

Alencar sempre vê episódios como esse em sua vida algo como orgulho ferido. Um ano antes da publicação de “O Guarani”, em 1857, publica-se um poema épico cujo nome é “A confederação dos tamoios”, de Gonçalves de Magalhães. Da temática, logo é possível inferir que narra sobre o indígena. A partir desta publicação, sai nos jornais da época, uma série de respostas em forma de cartas anônimas, assinadas sob o pseudônimo de “ig”, com revelações extremamente importantes para entendermos a ascensão literária de José de Alencar.

Essas cartas, claro, nada mais podiam ser do que uma nova resposta de Alencar. Com a publicação do texto épico, orquestrado com a participação direta do monarca, enciumado pelos dotes literários de Alencar, vê, em Magalhães, uma forma de diminuir os méritos daquele que seria o maior ícone da prosa romântica. Em contrapartida, Alencar foi contundente nas críticas presentes em suas cartas, que são críticas ferrenhas à Magalhães pela forma do poema que escreve. Alencar, porém, nos presenteia ao dirigir seus comentários ácidos, com elementos fundamentais que ele auxiliaria em sua obra.

É a intromissão de Alencar enquanto crítico literário que dará novos rumos à literatura.  Diante do espírito de liberdade em voga, ou seja, com o espírito de independência ainda recente, com as influências estrangeiras à literatura, como dissemos no exemplo acima, com a presença de diversas culturas aglutinadas, tudo isso, suscita num homem de fecundas leituras, exporem-nas no que ele pensa e sustentaria doravante.

Com esta visão perspicaz, Alencar se tornaria o grande escritor brasileiro que é. Não mais escrevendo como fez Magalhães, que ainda escrevia baseado nos moldes segundo até como fizeram os nossos árcades mineiros, com outra temática é evidente. Alencar assim, prevê a necessidade de si fazer da literatura uma nova poesia tanto na forma como no conteúdo, definindo uma marca originalmente nacional.

Rebate a forma utilizada por Magalhães dizendo que o modelo como Homero cantou os Gregos ou “o verso que disse as desgraças de tróia e os combates mitológicos não podem exprimir as tristes endeixas do Guanabara e as tradições da selvagem América”.

Ao dizer essas verdades naquelas citadas cartas, narra Heron de Alencar:

 “...Alencar sai a campo sai a campo para criticar A confederação dos tamoios negando-lhe validade  como expressão da nossa literatura e da nossa nacionalidade. E seu trabalho (ou seu projeto, como denominaremos mais adiante) é o resultado de estudo que parece haver realizado em três sentidos: os tratados de retórica, para captar as regras e os princípios orientadores das formas e gêneros literários então vigentes; a leitura das grandes epopéias da literatura universal, de Homero a Chateaubriand, para saber em que medida e até que ponto elas correspondiam a uma exigência de afirmação nacional; e, finalmente, a análise das condições históricas brasileiras, para estabelecer as necessárias diferenças entre o Brasil e países mais adiantados e mais velhos, compreender que a nossa incipiente literatura pedia outros fundamentos e orientação mais moderna

 Ainda, segundo este estudioso, Alencar faz:

cita Homero 24 vezes, chateaubriand 18, virgílio 17, Milton 13, Camões 8, Byron, Lamartine e Tasso 7 e Dante 5, analisando quase como um preceptista, o caráter e a significação da epopéia; na base disso, então, estuda o poema de Magalhães, do ponto de vista da técnica em relação aos clássicos e modernos, e do ponto de vista temático em relação ao Brasil, para concluir que em ambos os aspectos ele era inquestionavelmente falho

Em 1857, portanto, dá-se início à publicação do livro “O Guarani”, em folhetins diários. Esta obra aborda a temática do poema de Magalhães, porém com uma forma extremamente inovadora. “Fez um romance com tal encanto e interesse que obrigou o público a diariamente disputar o jornal que o publicava, para lê-lo impaciente, ali mesmo nas ruas...”. Depois, comenta brevemente sobre a obra “é romance bem feito, de sólida estrutura e mesmo de ousada arquitetura”.

Alencar, segundo o pesquisador consultado, Heron de Alencar, demonstra grande engenhosidade ao compor esta narrativa, isto comprova que ele não era um mero escritor iniciante. Pode-se dizer, em prova disso, que, numa das características mais enaltecedoras da obra e que chamam a atenção dos leitores de imediato contato com a leitura de O guarani, é a excessiva descrição dos fatos narrados. Porém, é esta uma característica explicável. Neste caso, Alencar é influenciado por chateaubriand, deste ele capta elementos que fundamenta a sua proposta de escrita na concepção do que podemos compreender como romance poemático. Assim, justifica-se o gosto Alencariano de, por exemplo, (da) “forma lírica, do tom melódico, da preocupação ornamental, da poesia como pintura...”.

Os estudos deste grande literato são de enriquecedor valor a sua obra. É com base neles, que vamos demonstrar o que Alencar conclui como sendo pertinente para compô-la. E assim estabelecer em qual fase ele encaixa O guarani.

Aquele projeto, como já mencionado, busca, a partir das pesquisas relativas aos tratados de retórica, dos estudos dos poemas épicos clássicos mundiais e do estudo histórico do Brasil, distribuir sua produção literária numa divisão por períodos, onde cada um de seus livros ocupa a função de registrar literariamente cada fase estudada, mapeando assim o Brasil desde sua “descoberta” até sua independência política. Na verdade, aqui podemos entender o quanto e qual é a real intenção de Alencar, ou seja, nitidamente nacionalista.

Os períodos são divididos em consonância com o projeto, assim: a fase primitiva – ou aborígene – compreende “as lendas e mitos da terra selvagem e conquistada, as tradições que teriam embalado a infância do nosso povo, e a ela pertencia Iracema”.

O segundo período chamado de histórico, “representaria o consórcio do povo invasor com a terra americana e termina com a independência”. Neste período, inclui-se O guarani.

A terceira fase, portanto, é “a infância da nossa literatura, começada com a independência política”, porém, a que se fazer reserva ao dizer que essas fases foram o limiar de fato da pretendida literatura como defende seu autor.

Todavia, é muito rico este assunto a ser debatido, que aqui, no plano da escrita e condensado, deve, senão, ser mencionado a fim de que se agregue valor à nossa pesquisa. Mas priorizamos a análise do livro O guarani tão somente, ainda que incluindo informações relacionadas à vida e obra autor, em detrimento da análise de sua obra de um ponto de vista genérico.

Joseyell D. Oliveira
Prof. ECA/EEPMM

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